Conhecido por
suas milhares de conquistas nos campos de batalha, nosso herói conquistou fama,
dinheiro, mulheres e até mesmo homens em toda história de sua vida. Era
conhecido como “Deus cabeludo”, por conta de suas madeixas, que se tornaram um
símbolo de beleza e poder. Crianças em toda sua era fugiam do aço afiado das
tesouras de suas criadas, para poderem - pelo menos em aparência - ser como seu
herói. Mas seu tempo não fora outrora, em uma época mitológica muito distante
não. Seu tempo foi logo ali, perto o suficiente para eu lembrar de tê-lo visto
em suas lutas constantes com bois na arena perto de um sítio em que eu vivia
com minha família. Sim, seu campo de batalha era a arena dos boiadeiros, onde
dava seu show todo final de semana. Seu sonho era ser reconhecido em todo
Brasil. Filho de Oxóssi e sabido do Catimbó, trazia em seu sangue o quente do
sertão, e o cheiro de carne queimada pelo sol das grandes caminhadas que fazia,
sempre tocando seu berrante para guiar o seu gado. Como quase todo herói
sertanejo, teve sua infância sofrida, marcada pela fome e pela morte. Seu pai,
uma galalau dado a jogos e mulheres, perdeu todo dinheiro da família e a vida
em uma arenga de bar. Sua mãe e irmã eram tudo que nosso herói tinha em vida e
era por elas que ele lutava. E como lutava! Quando entrava na arena, era como se
ele se transformasse no próprio Caboclo Boiadeiro, dançando com uma coreografia
intricada de passos rápidos e ágeis, que o fazia parecer um dançarino mímico,
lidando bravamente com os bois. E assim sua fama só crescia em todo sertão.
Mas como dizia
minha vó, “a fruta não cai longe da árvore”, e com o nosso herói boiadeiro não
deu outra: nasceu com gosto pra bebida forte e um coração fraco para os
assuntos do amor. Se desmantelou por uma cabrocha que já tinha dono e foi nela
que seu coração se perdeu. Mas por conta do amor não correspondido da Pequena,
o herói danou-se a beber e quase toda noite era encontrado pela estrada,
caminho de sua fazenda, com o andar sonolento e olhar pesado – coisa de quem
ama do jeito errado. E em uma dessas noites de tristeza alcoólica, o herói cambaleante
foi até a fazenda da Tal que lhe roubara a sanidade, tomar satisfação pela
ilusão que ele mesmo criara. Confuso e atordoado, se viu entrando em um pasto,
onde deu de cara com o Touro chamado Pesadelo, conhecido por sua impiedade e
força. Nosso herói então, se vê frente a frente com seu destino. Bêbado e à
beira da morte, ele dá um grito de desespero, chamando por seu senhor Caboclo
Boiadeiro, que lhe acudisse. Sob o som de um trovão, a entidade apareceu montada
em um cavalo, vestido de cangaceiro e sorrindo, uma risada escarnecedora. O boi
cai duro no chão e nosso herói, agonizante, olha para o espírito e não sabendo
se pela bebida ou pela situação quase morte, vê o rosto de seu pai, sorrindo e
zombado dele.
Não se teve
mais notícias do Herói boiadeiro depois do ocorrido no sítio de Pequena, nem
sobre o paradeiro de sua irmã e mãe. Há quem diga que foi pra cidade grande,
tentar a vida junto com elas. Mas o grande fuxico foi que o Herói boiadeiro
depois que matou o Touro Pesadelo à unha, fora chamado pelo próprio Oxóssi pra
combater perigos do outro lado, tornando-se assim, padroeiro dos que combatem
touro com as próprias mãos.